1-4 de Janeiro de 2024
Yucatán foi um ótimo lugar para aprender sobre as sutis diferenças que o solo e o clima podem causar na vegetação. A mata de "terra firme" é quase sempre dominada ou por oje (Brosimum alicastrum) ou por zapote (Manilkara zapota). Porém, há alguns outros elementos bastante importantes, como yuy (Vitex gaumeri), figueiras, tsalam (Lysiloma latisiliquum), muitas espécies de palmeira-leque, chechén e chacán (ver última entrada).
De acordo com a literatura, essa mata tem uma variação na península: o bosque yucateco seco. Essa diferença não está relacionada com a quantidade total de precipitação, mas a sua sazonalidade. Como os solos têm uma filtragem excelente, as águas da temporada úmida se esvaem rapidamente e, como a temporada seca no Norte da península é mais marcada e longa, só as espécies que conseguem resistir a vários meses sem água sobrevivem. Espécies comuns, segundo a WWF, incluem o tsalam e o ja'abin (Piscidia piscipula), bakal-ché (Cordia alliodora), e vários cactos ( mas eu não vi nenhum :/ ). Esse é o tipo de vegetação das ruínas de Chichen-Itzá
A Reserva de la Biosfera Sia Ka'an (que em maia quer dizer "presente dos céus") é um ótimo exemplo dos tipos de vegetação na interface terra-mar. No nível onde começam a aflorar as águas subterrâneas do vasto complexo de cavernas de Yucatán, ocorrem muitas vezes solos alagados constantemente (Gleissolos) que suportam a "sabana húmeda", dominada por gramas, orquídeas e o k'an-chik'-inche (Conocarpus suberosus) como único arbusto. Esse era um terreno bastante difícil de atravessar e por isso os maias construíram uma rede de canais navegáveis entre as lagunas. Não sei o porquê, mas em algumas áreas se observava uma floresta alagada, com Sabal mauritiformis e Ficus adaptadas a esse tipo de solo.
As lagunas recebem tanto água subterrânea da terra firme quanto água do mar, mas também são dotadas em geral de cavernas debaixo delas. Essas cavernas por vezes colapsam e dão origem a grandes buracos redondos no fundo das lagunas. Algumas, como a laguna Muyil, são formadas inteiramente por um desses colapsos. Entre essa interface de savanas e lagunas, há alguns "petenes" (em maia, círculos), de terra mais alta e não inundável, que são usados como fontes de água. Eles podem ser reconhecidos à distância pela presença de palmeiras como Cocos nucifera, Thrinax radiata e Acoelorraphe wrightii, que não suportam solos alagados. Esses petenes servem como reduto para muitas espécies de fauna, tanto aquática quanto florestal
As próprias lagoas também apresentavam uma quantidade considerável de vegetação aquática, com ninféias, pastos aquáticos (alimentos preferidos dos peixes-boi!) e juncos. Mais perto do mar, as restingas de areia dão suporte a comunidades de palmeiras, mangues, Scaevola sp. algumas lianas Apocynaceae interessantes.
Por fim, na costa se encontram incríveis praias de areias brancas e água muito azul, entrecortadas por recifes de corais atuais e antigos. A vegetação da praia apresenta muitas plantas adaptadas à salinidade, como Salicornia, Strumpfia, Borrichia, FImbristylis e outras. Vi alguns animais que eu nunca tinha visto antes, como corais-górgona, algas Rhodomelaceae, arraias e crocodilos!!!! (que preferem estuários de rios).
Por fim, queria falar do muito que pensei sobre o turismo em Yucatán. A região foi planejada como zona turística pelo governo mexicano nos anos 70, quando foi feito um estudo da melhor área para praias no país e a cidade de Cancún foi construída do zero. Isso gerou um boom enorme e vertiginoso de turismo principalmente Norte-Sul para a região, com luxuosos resorts. Tulum, 100km mais ao sul, também viveu essa onda, mas como a cidade era mais antiga, formou-se uma "fachada turística" na avenida principal, e os habitantes da cidade ficam a duas quadras. Alguns lugares como o parque Xel-ha, parecem a princípio ser ótimos exemplos de investimento ecoturístico, com atrações baseadas na natureza, uso responsável de recursos, e conscientização dos visitantes acerca da biodiversidade e sociodiversidade da região. Porém, os preços totalmente restritivos e a falta de inclusão da população são limites para esse exemplo; honestamente fiquei muito dividido. No geral a mata da península é bem preservada e pouco fragmentada, mas cada cidade turística é um centro para desmatamento em "espinha-de-peixe"
Beaucarnea pliabilis
Gliricidia sepium
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